Cerca de 5 milhões de filhotes foram devolvidos à natureza neste período na Rebio Trombetas
Criado no início dos anos 80 para conservar a maior área de reprodução da tartaruga-da-amazônia (Podocnemis expansa) até então conhecida, o programa com o nome Quelônios Amazônicos, conduzido na época pelo Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal (IBDF), e, posteriormente, pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), vinculado ao Ministério do Meio Ambiente (MMA), contribuiu para manter a sobrevivência dessa espécie de quelônio aquático na Reserva Biológica do Rio Trombetas (Rebio Trombetas), criada em 1979 para reforçar este trabalho de conservação.
Entre os anos de 2003 e 2004, o trabalho precisou ser ampliado com foco também em outros quelônios aquáticos, tracajás (Podocnemis unifilis) e pitiús (P. sextuberculata), que estavam sendo fortemente explorados de forma clandestina, correndo risco de extinção na região. A partir daí, passou a ser chamado de Programa Quelônios do Rio Trombetas (PQT) e a ter importante apoio da Mineração Rio do Norte (MRN). “Decidimos ampliar o programa para fazer a proteção destas espécies com a participação da própria comunidade. Então, a gente passou a contar com voluntários fazendo a proteção e o manejo dos ninhos destas outras duas espécies. Somando todos estes esforços, desde os anos 80 já foram devolvidos à natureza, pelo menos, 5 milhões de filhotes na Rebio Trombetas”, conta Marco Aurélio da Silva, coordenador de pesquisa e monitoramento do Núcleo de Gestão Integrada Trombetas do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).
A partir de 2007, o PQT passou a ser desenvolvido pelo ICMBio, órgão do MMA responsável pela gestão das Unidades de Conservação Federais, mantendo a parceria com a MRN e o Instituto de Pesquisas Ecológicas (IPÊ). Também conta com a fundamental participação de mais de 100 comunitários quilombolas voluntários, totalizando 30 famílias, que trabalham na proteção, no manejo e no monitoramento de ninhos, ovos e filhotes nos tabuleiros e praias de desova. “Os resultados positivos deste programa demonstram sua relevância para manter a conservação destas espécies no meio ambiente, principalmente dentro da Rebio Trombetas, e a educação ambiental das comunidades desta região”, declara Genilda Cunha, analista de Relações Comunitárias da MRN.
As ações de manejo reprodutivo desses quelônios são realizadas anualmente na região dos tabuleiros do alto Rio Trombetas e no Lago Erepecu, município de Oriximiná, oeste do Pará. À medida que avançam os nascimentos, os filhotes são soltos em pequenos grupos após curto período de 5 a 10 dias mantidos em cativeiro. Assim, há solturas periódicas de filhotes durante a estação reprodutiva das espécies.
Com a readequação do modelo do programa para atender as normas de segurança preventiva das autoridades de saúde por conta da pandemia de covid-19, os tradicionais eventos de soltura que marcam o final da temporada e que atraem toda a comunidade da região não poderão ser realizados nesse ano, porém ainda ocorrerão dois momentos de solturas simbólicas dos últimos filhotes nascidos nesta temporada, na primeira e segunda quinzena do mês de janeiro, sendo um na região dos tabuleiros do alto Rio Trombetas e outra no Lago Erepecu, envolvendo um público reduzido de comunitários voluntários.
Nascida em Óbidos e criada no distrito de Porto Trombetas, no município de Oriximiná, Fabrícia Reges Ferreira, 28 anos, começou a participar do PQT como voluntária em janeiro de 2020. Contratada desde julho como brigadista do ICMBIO, passou a coordenar a base do Tabuleiro, realizando um sonho de infância. “Incentivada pela minha professora na escola sobre a necessidade de proteção dos quelônios, sempre quis participar dos momentos de soltura dos filhotes quando eu era pequena, mas nunca consegui. Então, agora estou realizando meu sonho e de forma ampliada porque eu participo desde o monitoramento das tartarugas-da-amazônia adultas, protegendo a praia onde elas estão, os ninhos, acompanhando a desova e participando da soltura dos filhotes. Para mim, a soltura é o momento de ver que deu certo todo o trabalho anterior. É um sentimento de dever cumprido. Esse programa é de grande importância porque os quelônios necessitam dos nossos cuidados, para que sua população seja conservada e aumente na região”, explica.
Cerca de 80 mil filhotes de tracajás, pitiús e tartarugas-da-amazônia serão devolvidos à natureza na temporada 2020/2021 do PQT na Rebio Trombetas até o final deste mês de janeiro. “As solturas com participação de público nesse ano serão simbólicas e restritas aos comunitários voluntários do PQT para evitarmos aglomeração e manter o distanciamento social, sendo liberados cerca de 2 mil filhotes em cada chocadeira, e faremos os agradecimentos aos voluntários pelos esforços deles durante o programa nesse ano de 2020, que foi de grandes desafios para todos”, relata Marco Aurélio.